As minas que matam e amputam os pobres

A ONU aponta países que enfrentam anos de trabalho para desfazer os danos causados por bombas terrestres que mutilam milhares de pessoas por ano, especialmente os pobres, em países que passaram por desastrosas lutas pelo poder, como Camboja, do ditador cruel Pol Pot, líder do Khmer vermelho, que governou o país de1975 a 1979. Seguem a tragédia mundial: Moçambique, Sudão do Sul, Afeganistão, Croácia, Chade, Iraque, Tailândia e Turquia. Por ação da ONU, 2018, pelo menos 140 km² foram ficaram livres destes explosivos. Em cinco anos, mais de 800 km² foram limpos.
Desde que o Tratado de Ottawa de Proibição de Minas (1997) entrou em vigor, 31 Estados concluíram os processos de desminagem. Até 2025, 27 países-membros devem concluir esse processo, mas os mortos, amputados e enlutados, estes continuarão com lembrança daqueles que implantaram cruelmente estas minas terrestres, amputando a esperança de uma vida digna para os mais pobres.
O mesmo ocorre quando uma gestão pública além de não defender sua população mais vulnerável, dificultando o acesso á educação e saúde pública e que estas cumpram as metas e protocolos ínfimos propostos por diretrizes, leis, portarias e protocolos nacionais, deixa verdadeiras bombas armadas nas famílias, nas comunidades e na alma dos mais pobres.
Terceirizar atividades primárias de saúde, como funcionamento regular das unidades básicas de saúde, não oferecer medicação regular para doentes crônicos, hipertensos, diabéticos, pessoas com sofrimento psíquico severo, manter serviços de média e alta complexidade sem equipes completas, descumprindo, ou mesmo desconhecendo seus protocolos, não oferecer concurso publico para fixar e vincular profissionais a territórios específicos tem o mesmo efeito de armar minas terrestres, que levarão décadas para serem desarmadas.
Uma gestante que perdeu seu filho por falta de suporte hospitalar e profissional vai esquecer? Um marido que perdeu esposa e primeiro filho num parto não realizado voltará a acreditar no sérvio público de saúde? Uma mulher pobre, da zona rural que viu seu marido morrer por falta de diagnóstico preciso e condições mínimas de atendimento numa unidade de pronto atendimento ainda acreditará que o SUS é para todos?
Uma mãe pobre, negra e da zona rural que sabe que seu filho frequenta uma escola que teve média baixíssima na avaliação no IDEB acreditará que ele terá um futuro profissional digno? Será que terá que se submeter a algum politico de carreira para sobreviver?
Nossas minas estão armadas e enterradas, já causando mutilações. Vemos jacobinenses dedicados, alguns pobres e da zona rural, mulheres, que desenvolviam suas atividades no serviço público com vínculo profissional frágil, com quase nenhuma condição de trabalho, receberem proposta para ter o horário reduzido e ficar com salário de 580 reais por mês. Terão esperança num futuro com justiça social?
Outros saíram da região, se formaram, se especializaram, voltaram para sua terra e aceitaram trabalhar em condições nunca tão precárias neste município, amargando o dissabor de ter meses de atraso de salário, antecipando pagamento de tributos, correndo risco de errar por péssimas condições de trabalho, colocando seus nomes em julgamento. Continuarão acreditando no serviço público?
Saúde e educação com baixa avaliação e comprovada ineficácia já bastaria para mutilar muita gente por décadas. Hipertenso sem acompanhamento regular terá grande chance de sofrer um acidente vascular cerebral e ficar com grande sequela. Se for agricultor, moto taxista, não terá mais como trabalhar. Um diabético sem uso regular das suas medicações e acompanhamento poderá ter um membro amputado, ficar cego ou sofrer um infarto. Sendo ele pobre e da zona rural, terá péssima qualidade de vida, causando sofrimento familiar.
Um jovem de doze anos que ainda não aprendeu a ler e não pode trabalhar legalmente, na idade adulta estará condenado a aceitar emprego com salário abaixo do mínimo nacional, passando por necessidades e desacreditando que é cidadão de direitos. Se for negro, ainda sofrerá preconceito racial.
Uma jovem negra da zona rural que não tenha acesso à educação de qualidade, nossos índices locais são vergonhosos, bem abaixo da média seis para 2022, sem as informações sobre contracepção, acabará grávida precocemente e sem suporte para acompanhamento da gestação e parto. Depois não terá creche de qualidade para deixar o filho e se conseguir emprego será na condição de aceitar 500 reais por mês. Acreditará em igualdade de direitos de gêneros?
Tudo isso poderia ser facilmente evitado com o mínimo de empatia e protocolo administrativo da gestão para lidar com os mais vulneráveis, fazendo funcionar os serviços básicos. Falta de compromisso e de conhecimento técnico pode matar mais que bombas terrestres, pois além de mutilações e mortes imediatas desacreditará toda uma população nos políticos de origem pobre e da zona rural.

Cledson Sady
Membro da Academia Jacobinense de Letras

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