A escalada dos prejuízos das estatais federais no atual mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) escancara problemas de má gestão, ingerência política e falta de transparência na condução das empresas. Também joga por terra a justificativa de que os resultados anteriores são fruto de investimentos que trariam retorno no longo prazo.
De janeiro a julho deste deste ano, empresas controladas pela União acumularam déficit de R$ 8,83 bilhões, quase 25% maior que o resultado negativo de todo o ano passado, que já havia sido recorde, de R$ 6,73 bilhões. É o pior resultado da série histórica do Banco Central, que começa em 2002.
Os dados não incluem empresas do grupo Petrobras, excluído das estatísticas fiscais por seguir regras de governança similares às de empresas privadas de capital aberto e ter autonomia para captar recursos no Brasil e exterior. Pelo mesmo motivo, os registros históricos excluem o grupo Eletrobras, que foi privatizado em 2022.
Os números contrastam com os apresentados a partir de 2018, ainda no governo de Michel Temer (MDB), quando o superávit anual das empresas foi de R$ 3,47 bilhões. O ápice foi registrado em 2019, com R$ 10,29 bilhões. O ano de 2022, fim da gestão Jair Bolsonaro (PL), foi também o último ano de contas no azul, com resultado de R$ 4,75 bilhões.
Em 2023 a trajetória se inverteu. O déficit naquele ano foi de R$ 656 milhões e o cenário só veio se agravando. Desde então, o governo Lula tem defendido que o resultado contábil reflete despesas com investimentos. A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, argumenta que os recursos da União injetados em gestões anteriores teriam permitido às empresas financiar projetos estratégicos que estariam demandando novos recursos, o que não deveria ser contabilizado como prejuízo.
Os aportes foram feitos durante as gestões dos ex-presidentes Temer e Bolsonaro, quando um programa de saneamento das contas das estatais foi implementado. Na prática, os aportes cobriram déficits anteriores, mas as estatais abriram novos rombos.
De novo no vermelho
Estatais federais entram no terceiro ano consecutivo de resultados negativos.
Números desmontam justificativa do governo sobre estatais
Para economistas ouvidos pela Gazeta do Povo, os números e a situação atual de algumas estatais contribuem para desmontar o argumento governamental. “Esse déficit era, de certa forma, esperado por quem não comprou a narrativa do governo”, afirma João Pedro Paes Leme, economista da consultoria Tendências.
“Os investimentos podem ter contribuído para o registro inicial de déficit, mas o que se vê agora são fatores estruturais relacionados à máquina dessas empresas, que mostram que elas não conseguem competir de forma adequada no mercado e acabam gerando problemas orçamentários. Um dos mais recorrentes é o não pagamento da Previdência.”
Murilo Viana, analista de contas públicas, vê má gestão, aparelhamento político e uso de empresas como instrumento de desvio de recursos públicos. “Apesar de o investimento ter crescido, isso não explica o problema nas contas das estatais federais”, diz.
“Pelo contrário, o que se vê é a piora da qualidade do investimento público nessas empresas cujas ações se tornaram veículos de uso político”, acrescenta. “Sabemos dos graves e escandalosos problemas ligados, por exemplo, às emendas parlamentares. Muitas vezes têm como veículo de execução justamente uma estatal. O exemplo mais claro é a Codevasf [Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba].”
Fonte: Gazeta do Povo