
O município de Caém, no sertão baiano, nasceu do chão batido, da fé de seus primeiros habitantes e de uma pitada inusitada de sotaque francês. Antes de ter nome próprio, a região foi conhecida por diversas designações — Fazenda Gameleira, Fazenda Lagoa do Boi e Olhos D’Água. Cada nome, uma fase da história. Cada fase, um marco da transformação. Mas foi só com a chegada da Estrada de Ferro Leste Brasileiro, planejada para ligar Senhor do Bonfim a Jacobina, que o povoado começou a sonhar com autonomia e identidade própria.
Tudo começou com a coragem dos primeiros moradores. Manoel Pereira Sobrinho e sua esposa Maria Laurinda chegaram por volta de 1918, vindos do Catuni (Jaguarari), e foram os primeiros a desbravar a região. Com o tempo, outras famílias se juntaram: Manoel Antônio, Zezinho de Nozinho, Zuca do Bonfim, entre tantos outros que colocaram a mão na enxada e os pés no barro para erguer casas, plantar lavouras e formar comunidade. Era o início de uma vila que ainda nem sabia que um dia seria cidade.
A mudança definitiva veio com os trilhos. A instalação da estação ferroviária, um marco para o sertão da época, trouxe não só progresso, mas também gente nova. Entre eles, um personagem curioso: o engenheiro francês Dr. Henry De Broutelles, idealista e dedicado, que comandava a obra da estrada de ferro. Casado com madame Marth De Broutelles, natural da cidade de Caen, na Normandia, o engenheiro decidiu homenageá-la dando ao povoado o nome da cidade natal de sua esposa. Assim nasceu Caém — com acento e sotaque do sertão, mas raízes no coração da França.
O nome, que à primeira vista parece exótico para uma cidade sertaneja, ganhou significado para o povo. Era curto, sonoro e intrigante. E de fato, Caém é dessas palavras que não se encerram nela mesma, que pedem complemento, que puxam conversa. Não por acaso, o nome virou identidade e orgulho para um povo que não se cansa de repetir: “eu sou do Caém”.
O saudoso Arnaldo de Oliveira, ex-prefeito e autor do livro “Minha Vida e Minha História”, conta tudo isso com detalhes. Filho do Sítio Papagaio, Arnaldo viu o município nascer, crescer e se organizar. Foi testemunha ocular da transformação de um vilarejo em cidade e um dos protagonistas dessa jornada. Hoje, seu legado é mantido por seu filho, o atual prefeito Arnaldinho, que dá continuidade a essa história que ainda pulsa nas ruas e no coração dos caenenses.
Este artigo é o primeiro de uma série que contará, passo a passo, os caminhos trilhados por Caém até os dias atuais. Nos próximos capítulos, vamos falar da chegada da energia elétrica, da fundação das primeiras escolas, das festas religiosas e da vida política que movimentou o município. Porque Caém não é só um ponto no mapa — é um pedaço vivo da Bahia profunda, com passado de luta e futuro promissor.
João Batista Ferreira, radialista/jornalista/estudante de História
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